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Especial 2021
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Saúde

NOMOFOBIA

  • Nunca a comunicação foi tão acessível e vasta, fácil e abrangente. Mas estamos nos comunicando melhor? Nunca os contatos se tornaram tão variados e diversos. Mas as amizades aumentaram e se multiplicaram por causa disso? Escrevemos mais, falamos mais, nossas vidas estão mais expostas e cada vez mais compartilhadas no mundo virtual. E no mundo real, como estamos?

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    Há uma lista enorme de benefícios relacionada a era dos progressos técnicos e científicos, como podemos citar os avanços na medicina com grandes resultados na redução da mortalidade infantil, no aumento da expectativa de vida da população, entre várias outras consequências positivas. Assim como poder escutar e visualizar um filho ou uma pessoa especial que está a milhares de quilômetros de distância; assistir e acompanhar aulas, participar de reuniões e cursos a distância, dentre outras evoluções. 
    Porém, tudo o que é novo exige um certo tempo de distanciamento para que o próprio tempo nos sinalize as consequências das transformações que estamos vivendo. E tempo é algo que a sociedade anda carente; o tempo de reflexão, de elaboração, tempo de espera e de viver o que tem que ser vivido.
     
    Entre o normal e o patológico, existe uma fronteira tênue e difícil de ser traçada. Enquanto algumas pessoas utilizam das tecnologias de forma saudável, outras usam de forma abusiva devido a lazer e trabalho; e alguns podem se tornar escravos e dependentes dessas tecnologias. 
    A palavra NOMOFOBIA é uma palavra dos tempos modernos. Surgiu na Inglaterra, a partir da expressão “no mobile phobia”, que significa fobia de ficar sem telefone celular (TC). “Consiste num desconforto ou angústia, causado pela impossibilidade de comunicação por meios virtuais, aparelhos de telefone celular (TC), computadores, tablets ou outros. É o medo de ficar incomunicável, longe do TC ou desconectado da internet.
    Com o desenvolvimento das tecnologias de comunicação e informação (TICs), ocorrem, consequentemente, alterações na vida, nos hábitos e costumes da sociedade, no comportamento das pessoas, e inclusive efeitos no meio ambiente. Existem tanto benefícios quanto prejuízos causados por esses impactos. 
    Considera-se patológico o uso das tecnologias, quando estas passam a causar interferências e comprometimentos na vida pessoal, social ou familiar do indivíduo, gerando prejuízos na sua qualidade de vida. E a palavra NOMOFOBIA surgiu da necessidade de se nomear essas alterações de comportamento observadas, para assim compreender melhor esse quadro, classificar e estabelecer tratamentos.
    NOMOFOBIA vai “designar o desconforto ou angústia causados pelo medo de ficar incomunicável ou pela impossibilidade de comunicação por intermédio do TC, computador ou internet (ficar off-line).”
     
    Psiquiatra Dra. Bruna Vasconcellos Kallas: “Tudo o que é demais não faz bem.† Residência Médica em Psiquiatria no Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira - Campinas/SP CRM-MG. 53.782  |  CRM-SP.  160.579
    Psiquiatra Dra. Bruna Vasconcellos Kallas: “Tudo o que é demais não faz bem.”

    Residência Médica em Psiquiatria no Serviço de Saúde Dr. Cândido Ferreira - Campinas/SP CRM-MG. 53.782 | CRM-SP. 160.579

     

    Alguns sintomas observados, como angústia, desconforto, insegurança e ansiedade são denominados sintomas nomofóbicos. E fala-se também em comportamentos nomofóbicos
    A dependência do TC e do computador pode ser considerada normal ou patológica. A natural está relacionada ao lazer e ao trabalho, ao conforto e à conveniência, à segurança e ao bem-estar que os indivíduos têm ao disporem desses dispositivos tecnológicos.
    Já na dependência patológica, observa-se a presença de sintomas como o medo, a angústia e o desconforto quando há a impossibilidade de uso dessas tecnologias. Esses sentimentos, sintomas e novos padrões de comportamento são frutos de uma convivência inadequada, excessiva e diária com esses dispositivos de comunicação.
    Em todas as fobias, não é necessário que o indivíduo viva a experiência de forma absoluta e concreta. Muitas vezes, basta pensar de forma equivocada sobre ela para ter o desencadeamento dos sintomas e sensações. 
    Na nomofobia, assim como em qualquer caso de uso indevido de substâncias, mesmo sendo relacionada a objetos como o TC ou computador, pode-se observar sintomas da síndrome de abstinência em alguns indivíduos quando se vêem impossibilitados de uso desses dispositivos. Sintomas como angústia, ansiedade e nervosismo foram relatados assim como ocorre em pacientes que fazem uso abusivo de álcool ou drogas. Há relatos de pessoas que apresentaram uma profunda crise de abstinência ao terem que passar 12 horas longe do TC
    Geralmente, as pessoas que tendem a desenvolver nomofobia são aquelas mais inseguras, dependentes, com perfil ansioso e uma predisposição característica aos transtornos de ansiedade. O uso patológico das tecnologias está muito associado aos transtornos de ansiedade como o transtorno do pânico, o transtorno obsessivo compulsivo, a fobia social. Com o tratamento do transtorno primário (do tipo de transtorno ansioso por exemplo), costuma-se observar a redução dos comportamentos negativos e dos sintomas de dependência em relação a esses dispositivos (computador ou TC).
    O indivíduo com um transtorno de ansiedade como diagnóstico primário pode desenvolver essa dependência patológica das tecnologias, já que esses dispositivos de certa forma reduzem o estresse, costumam trazer uma sensação de segurança, bem-estar e confiança aos usuários.
    Atualmente, existem alguns ambulatórios da saúde mental especializados no atendimento de usuários abusivos e dependentes das tecnologias. O primeiro centro no Brasil especializado nesse perfil de dependência foi o GRUPO DELETE, do Instituto de Psiquiatria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Este grupo surgiu como um projeto de pós-doutorado de uma aluna do IPUB/UFRJ, sendo oficializado em 2013. 
    Em São Paulo, vinculado ao Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPQ/ HCFMUSP), elaboraram um Programa de Orientação a Pais de Adolescentes Dependentes de 
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    Internet (PROPADI), no Ambulatório Integrado dos Transtornos do Impulso (AMITI).
    Nesses centros especializados de atendimento, verificaram relatos de pacientes com transtorno do pânico associado a dependência patológica ao computador ou TC. Observaram que muitas vezes, nesses casos, existia uma relação de segurança com o telefone celular (o paciente se sentia seguro com o celular em mãos como se estivesse acompanhado por outra pessoa). Em casos de pacientes com fobia social associada ao “apego patológico” ao computador, observaram que este dispositivo servia como “escudo” para uma proteção dos contatos ao vivo. Indivíduos que apresentam fobia social costumam referir medo quando se sentem expostos ou a mercê da observação e crítica alheia.
     
     
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    Dessa forma, se reforça a importância do tratamento do transtorno primário, como forma de tratar inclusive essa  dependência patológica das tecnologias. O tratamento das fobias considerado eficaz na literatura científica consiste na associação de medicação e terapia cognitivo-comportamental (TCC).
    Na China, foi feita uma pesquisa e mostraram que 42% das pessoas que utilizam a internet são dependentes dela, o que está levando a criação de um manual de tratamento. 
    De acordo com um artigo do Daily Mail (2008), 13 milhões de britânicos, em torno de 53% de usuários de aparelhos de TC, sofrem alguma sensação ou desconforto ou sintoma quando estão impossibilitados de utilizar o aparelho.
     
    Para os jovens, não existe uma idade considerada correta para a utilização desses dispositivos tecnológicos. O que é necessário e preciso é dosar a quantidade do tempo de uso para crianças e adolescentes. É importante também observar os sites acessados e ficar sempre atento aos contatos que esses jovens estão fazendo e saber com quem eles estão se relacionando.
    E devido ao hábito de permanecer muitas horas em frente ao computador ou internet, muitas crianças, adolescentes e adultos estão se tornando sedentários e obesos. 
    Portanto, “tudo o que é demais não faz bem”. O uso consciente das tecnologias permite muitos avanços e benefícios, a “ampliação de horizontes” e pode modificar percepções de realidades, do tempo e espaço. Mas, como tudo que é em excesso e extremo, o seu mau uso traz consequências ruins para a saúde física e psíquica do indivíduo e gera muitos prejuízos na sua qualidade de vida. 

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